“Diva é uma coisa séria. Diva é diva”.
Com essas palavras, a travesti Fujika de Halliday define bem o que significa
ser uma “diva”. Halliday é uma das personagens do documentário Divinas Divas
(2016), de Leandra Leal. A atriz presta uma homenagem a um grupo de travestis que, com coragem,
determinação e talento, conseguiu construir carreiras artísticas consolidadas,
tendo sido também significativamente importantes para a causa LGBT no país,
enfrentando, inclusive, épocas difíceis, como o regime militar. Rogéria, Jane
di Castro, Divina Valéria, Eloína de Leopardo, Camille K, Fujika de Halliday,
Marquesa e Brigite de Búzios são reveladas, no filme, pela chave do afeto.
Porque Divinas Divas é,
sobretudo, um filme sobre afetos. A começar pela própria diretora, Leandra
Leal, para quem o Teatro Rival, onde as artistas começaram a se apresentar na
década de 1970, era uma segunda casa desde a infância. Durante muitos anos
administrado por seu avô, o teatro foi um dos primeiros espaços no Rio a abrir
as portas para as travestis fazerem shows. Após a morte do avô, o teatro passou
a ser comandado pela sua mãe, a também atriz Angela Leal. As travestis
homenageadas têm uma relação de muito carinho não só com aquele espaço mas com
Leandra. Baseada em depoimentos das personagens, a narrativa se divide entre
entrevistas, performances cheias de brilho e
ensaios para o show de comemoração do aniversário de 70 anos do teatro.
Mas os afetos não se resumem ao lugar.
As relações afetivas exploradas no filme envolvem ainda familiares, namorados,
carreira artística e público. A própria Leandra Leal declara o quanto aquelas
travestis fizeram parte de seu mundo e, por isso, soa tão natural essa
demonstração de carinho através do filme. De forma muito sensível e delicada e,
ao mesmo tempo, contundente, Divinas Divas enfoca também o preconceito,
a transformação dos corpos, a perseguição durante a ditadura e a aceitação (ou
não) da família. Com um tom predominantemente leve, Divinas Divas
equilibra-se entre o humor, a emoção e a crítica à sociedade brasileira.
Lecco França é professor
universitário, pesquisador, curador e crítico de cinema. Doutor em Letras pelo
Programa de Pós-graduação em Literatura e Cultura da Universidade Federal da
Bahia.
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